Caríssimos amigos!
Hoje quero falar-vos daqueles que não jogam com os pés, mas sim com a cabeça. Aqueles que, por meio de uma obsessão com o jogo e com ganhar, deixaram o seu cunho no mundo do futebol. Aqueles que, garantidamente, mudaram o jogo que amamos ao conseguirem transmitir pensamentos para os seus jogadores.
Hoje, claro está, falamos de treinadores.
E comecemos pela pergunta do título: quão bons eram os melhores treinadores de futebol do mundo como jogadores?
Os mais apressados de vós dir-me-ão imediatamente:
— Que observação ridícula, ó João! Então não sabemos já todos que o Mourinho não foi nada de especial como jogador e é um dos melhores treinadores do mundo? E não sabemos até que o Klopp, que tinha “talento de quarta-divisão e cabeça de primeira”, nunca jogou ao mais alto nível?
Isso é tudo verdade, mas não será que por cada Mourinho há 5 Cruyff’s? Ou que por cada Klopp haverá 2 ou 3 Kenny’s Dalglish?
É isso mesmo que vamos investigar nesta edição. Venha daí comigo!
Os 100 melhores de sempre
Para proceder a esta análise comecei por entregar a uma entidade já reputada a árdua tarefa de escolher 100 treinadores de futebol que tenham conseguido registar o seu nome na história do desporto.
Assim sendo, o ‘ranking’ ficou ao critério da FourFourTwo, que, com contributos de 6 jornalistas consagrados no desporto, elaborou uma lista que, mesmo podendo sofrer alguns ajustes aqui e ali, é minimamente unânime.
O grande vencedor é o escocês Alex Ferguson, que dispensa apresentações e que terá nos seus 27 anos à frente do Manchester United o seu trabalho mais notável.
Como poderá constatar, há demasiada qualidade nesta lista e o facto do turco Terim vir na nonagésima-nona posição (ele que até tem o seu próprio documentário na Netflix) é um sinal disso mesmo.
Análise
Apresento-lhe agora alguns quadros que resultaram de uma meticulosa investigação individual a cada treinador na lista.
Numa primeira análise mais macro, fiz uma divisão dos mesmos por nacionalidades e posições dos treinadores.
No que toca a nacionalidades, destaque óbvio para os países europeus, com 86 dos 100 treinadores a serem originários desta região do globo. Sem grandes surpresas, Itália, Alemanha e Inglaterra são os grandes “fornecedores” dos cérebros do jogo.
No entanto, temos de destacar a Escócia, que com cerca de 5,5 milhões de habitantes e não sendo historicamente uma das melhores ligas do mundo, consegue ter 8 treinadores no ranking.
Nota: Para as duas análises seguintes (posição e nível do jogador) existem jogadores para os quais não foi viável obter informação credível, pelo que não foram contabilizados.
Já em termos de posições, fica claro que os jogadores que jogaram no centro do terreno (48%) são os que aparecem mais frequentemente nesta lista. As diferenças entre defesas e avançados são negligíveis.
Para lhe matar já a curiosidade, posso adiantar que o único guarda-redes nesta lista é o belga Raymond Goethals, mais conhecido por “Raymond-la-Science”.
Finalmente, olhemos agora para a análise que nos permite responder ao título desta edição da Factball. Para isto, optei por categorizar as carreiras dos “treinadores” em três patamares diferentes:
Jogadores de 1.ª Divisão, ou seja, jogadores que atuaram na primeira divisão de um qualquer país;
Jogadores de Topo, i.e., aqueles que representaram clubes nas principais ligas de futebol no panorama mundial da época em questão;
Jogadores Internacionais, ou seja, aqueles que representaram a seleção A do seu país pelo menos numa ocasião.
Como é fácil constatar, quase 82% dos melhores treinadores de sempre foram jogadores de primeira divisão. Se por um lado isto não é inesperado, por outro, mostra que não é uma condição necessária para se chegar ao topo.
Aumentando um pouco o grau de competência, vemos que cerca de 63% dos treinadores foram jogadores de topo. Aqui estão incluídos, por exemplo, os casos de Silvia Neid (que representou o SSG Bergisch Gladbach, a equipa dominante do futebol feminino alemão) mas também o caso de Mário Zagallo, que atuava no Brasil numa altura em que as equipas desse país “davam cartas” pelo mundo.
Finalmente, olhando para os treinadores que atingiram o patamar máximo na carreira de qualquer atleta, representar a seleção principal do seu país, reparamos que já só 51% o conseguiram fazer.
Conclusão
Depois de tudo o que vimos, há três grandes pontos que gostaria que levasse daqui.
Em primeiro lugar, estar ligado ao futebol europeu tem um peso considerável no sucesso como treinador, ainda que não existam nacionalidades específicas que garantam o sucesso. Talvez isto possa mudar no futuro, (MLS, está à escuta?) mas enquanto as principais ligas de futebol se situem no Velho Continente, parece improvável.
Depois, ter uma visão mais abrangente do jogo, por jogar no meio-campo, pode ser um forte indicador de sucesso futuro como treinador. O facto de esta posição normalmente requerer mais rigor e mais atenção por parte dos treinadores e dos jogadores pode justificar um eventual aumento nas capacidades intelectuais de entendimento do jogo, que mais tarde se traduzem numa carreira de treinador.
Finalmente, podemos afirmar com confiança que não é preciso ter sido uma estrela do futebol mundial enquanto jogador para se atingir patamares estratosféricos como treinador. Mas também temos de ser justos e afirmar que é necessário ter pelo menos tentado escalar a pirâmide do futebol e conhecer os meandros de um balneário.
Confesso que antes de analisar os dados, a minha ideia fosse mais “negra” e imaginei que uma maior percentagem dos 100 tivessem sido grandes craques mundiais.
Aqueles 15 que não atuaram em primeiras divisões são os que dão alento a todos nós que querem entrar na indústria, mas que nunca jogaram num estádio cheio de gente a gritar o seu nome!
Por esta semana é tudo.
Um abraço e uma defesa impossível de Gordon Banks,
João Francisco
Prolongamento
Facto 🔍
Samuel Eto’o ganhou dois “trebles” consecutivos: em 2009 com o Barcelona e em 2010 com o Inter de Milão.
Leitura 📖
The Premier League runout songs
🖋 Nick Miller no The Athletic