Caro leitor,
como já viu pelo título, hoje falamos da Liga dos Campeões da UEFA.
É verdade, a Champions é muito provavelmente a mais prestigiada competição de clubes do mundo e é o troféu, a par do Campeonato do Mundo da FIFA, que todos os jogadores ambicionam um dia levantar.
Este tópico até podia ter surgido porque daqui a poucos dias temos a final de mais uma edição, que irá opor o City de Pep Guardiola, ao Inter de Simone Inzaghi.
Mas não. O principal motivo é que atingimos um número redondo de edições completas. É verdade, já lá vão 30 épocas de Champions League desde o rebranding. Esta nomenclatura e imagem, mesmo que tenham existido algumas mudanças de formato, entretanto, aconteceu na época de 1992/93. Nessa época, para gáudio dos franceses, o campeão foi o Marselha de Deschamps, Ayew, Desailly, Völler, Bokšić, Barthez e companhia. Mal sabiam eles que seriam a única equipa francesa a ganhar a “orelhuda” até aos dias de hoje (bonjour PSG, ça va bien?)…
No entanto, o que me proponho a trazer-lhe hoje é uma análise um pouco diferente, um pouco mais abrangente. Analisarei esta competição de um ponto de vista “nacionalista” e assim trazer-lhe um pouco da intensidade dos duelos entre países para o mundo dos clubes e claro está da Liga dos Campeões.
Em termos de vencedores, as contas são simples:
Espanha é a grande líder, destacadíssima, muito por culpa do “comilão” Real Madrid. Inglaterra e Itália, que discutem o título desta época, completam o pódio. Ou os italianos empatam, ou os ingleses alargam a vantagem. Como se já não existissem ingredientes suficientes para nos agarrarmos à televisão no dia 10 de junho…
Pois bem, mas a análise dos vencedores é demasiado simples e não precisaria de ler esta Factball só para isto. Assim sendo, aprofundemos a questão com recorrendo aos factos, claro está.
A Champions das Nações
A minha análise recairá sobre os protagonistas máximos deste nosso querido jogo, os jogadores, ao longo das 30 épocas já concluídas somadas da presente temporada. Os dados foram extraídos do FBref e não incluem as rondas de qualificação.
Ao todo, já entraram nas fichas de jogo atletas de 142 nacionalidades diferentes, o que quase certamente fará desta a competição mais global do desporto-rei.
Por esta razão, atentemos à evolução deste indicador ao longo dos anos.
A primeira edição desta análise contou com 52 nacionalidades enquanto a presente edição conta com 79. A Champions com mais diversidade foi a de 2010/11 com um total de 84 nacionalidades diferentes, em contraponto com a época de 1995/96 onde “apenas” participaram atletas de 36 países.
Esta diferença ao longo dos anos não é chocante, uma vez que:
Foi a partir de 1995 que o Acórdão Bosman, já aqui falado, entrou em vigor e permitiu aos jogadores de futebol transferirem-se livremente.
O número de equipas em competição também aumentou, dando automaticamente aso a uma maior variedade de jogadores.
No entanto, olhando para o gráfico, parece que atingimos um patamar de segurança e não parece que exista uma evolução ascendente no número de países a colocar jogadores nesta competição.
Em jeito de curiosidade, deixo-lhe ainda as 3 nacionalidades que tiveram jogadores convocados, mas que não chegaram a jogar qualquer minuto na competição: Andorra, Maurícias e Filipinas.
O top 5
Como dos “fracos não reza a história”, olhemos agora para as 5 nações que ao longo destes 30 anos colocaram mais jogadores na competição e jogaram mais minutos. Tal como tínhamos visto com os títulos, Espanha também leva este “troféu”, se bem que aqui a vantagem já não é tão significativa.
Para colocarmos estes dados em perspetiva, digo-lhe que, em média, cada edição da Champions teve 666 jogadores, sendo 54 desses provenientes de Espanha, o que representa cerca de 8%.
O Brasil, não pertencendo ao continente onde se joga a competição, aparece em segundo lugar, com 49 atletas em média por época, cerca de 7%, confirmando assim o seu estatuto como o grande país exportador de talento a nível mundial.
França, Alemanha e Itália completam este ranking.
Número de jogadores
Olhemos agora para o top 5 anteriormente referido, mas do ponto do vista do número de jogadores que participaram na competição a cada ano.
Para analisarmos esta evolução, podemos verificar no gráfico acima que o número de jogadores tem aumentado, de forma geral, para todos os países. No entanto, podemos claramente ver certas predominâncias em determinados momentos.
No início dos anos 2000, França assumiu a liderança algumas vezes, mas sempre seguida de perto pela Espanha. A partir de 2005 podemos observar uma rápida ascensão do Brasil que se mantém na liderança até 2012. A partir daí, Espanha nunca mais largaria o primeiro lugar, que se mantém até aos dias de hoje.
Minutos jogados
O segmento dos meus leitores mais ávidos já saberá, por via de uma das minhas pesquisas aqui publicadas anteriormente, que sou um grande fã da contabilização dos minutos jogados como medida do valor dos atletas. Assim sendo, nesta análise também não poderia faltar um ranking por minutos.
Ao contrário da classificação por número de jogadores, aqui podemos ter uma noção da qualidade dos jogadores de cada país, visto que, de forma geral, dá-se prioridade aos melhores jogadores na melhor competição do planeta. Assim sendo, é muito interessante ver como estes dados corroboram a recente evolução das gerações francesas, que têm realizado sempre boas prestações nas competições de seleções em quase todos os escalões.
Além disso, a diferença entre os italianos e os demais também foram mais notórias nos últimos anos, sendo que os últimos dados do gráfico já incluem os 3 semifinalistas desta edição (Nápoles, Milan e Inter), daí aquele incremento visível.
O decréscimo do Brasil e de Espanha no passado recente também é bastante interessante e contrasta com os seus números na classificação por número de jogadores.
Conclusão
Os dados não enganam e há claramente um conjunto de países que colocam muito mais jogadores na principal competição de clubes europeus.
Acredito que existam algumas lições a retirar destes dados e algumas considerações a fazer para o futuro.
A análise dos minutos jogados será a mais pertinente e nesse sentido é necessário pensar na situação dos jogadores brasileiros e espanhóis. Sendo estes os dois países que colocaram mais jogadores e jogaram mais minutos nos últimos 30 anos, é interessante constatar que o número de minutos jogados tem diminuído. Se por um lado os resultados dos brasileiros possam ser explicados com a maior necessidade de adaptação às diferentes táticas entre os clubes europeus e os brasileiros, o resultado dos espanhóis é mais difícil de explicar. Uma das possibilidades será o facto de o jogador espanhol, em média, ser mais caro de adquirir por parte de clubes de outras ligas e assim cingem-se mais a clubes do seu país, que ultimamente não têm chegado às fases mais adiantadas da competição, excetuando claro, o Real Madrid.
Se olharmos para França, o facto da sua liga ser a 5.ª melhor do continente, dá muito espaço de manobra para que os clubes dos outros 4 campeonatos acima contratem e segurem os melhores jogadores desta nacionalidade. A somar a isto, o ótimo trabalho desenvolvido nos escalões de formação e o talento que tem emergido nas últimas gerações, fazem desta nação uma potencial candidata a agarrar a liderança deste ranking num futuro próximo, se, obviamente, os seus clubes também conseguirem chegar mais longe nas fases a eliminar da prova.
Uma nota ainda para a estagnação no número de nacionalidades. É claramente um sinal de que existem já muitos países a participar na competição, mas demonstra também que de forma geral, o panorama do futebol não tem visto evoluções significativas no que toca a novos focos de talento ou competitividade fora daquilo que já é conhecido. Das 142 nacionalidades que já participaram na competição, apenas uma média de 78 nos últimos 10 anos têm tido jogadores convocados. Talvez o “desenvolvimento global” apregoado avidamente pela FIFA não esteja a produzir os resultados pretendidos ou então atingimos mesmo o patamar máximo de diversidade (custa-me acreditar nesta segunda opção).
Esta semana ficamos por aqui. Como deve ter reparado, houve uma alteração no visual da publicação, pelo que terei todo o gosto em ouvir a sua opinião. No final de contas, é por si e para si que continuo a escrever. Obrigado por estar desse lado.
Um abraço e um drible de Mané Garrincha,
João Francisco
Prolongamento
Facto 🔍
O primeiro jogo de futebol alguma vez transmitido em direto na rádio foi um Arsenal vs Sheffield United, a 22 de janeiro de 1927, pela BBC.
Leitura 📖
The chaos and controversy of Barcelona’s Camp Nou rebuild – a special report
🖋 Dermot Corrigan no The Athletic